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A Lei nº 9.514/97, que dispõe sobre o Sistema de Financiamento Imobiliário, institui a alienação fiduciária de coisa imóvel e dá outras providências. Neste artigo, vamos destacar a interpretação recentemente consolidada pelo STJ sobre o momento certo para que o credor fiduciário possa exigir o pagamento da taxa de ocupação do imóvel, por mês ou fração, do devedor fiduciante.
Em tempos de crise, desemprego, elevação da taxa básica de juros e da inflação, o inadimplemento dos contratos de financiamento imobiliário – principalmente naqueles atrelados ao IPCA e à caderneta de poupança – é uma crescente, já identificada pelo Banco Central, mesmo após a renegociação em massa ocorrida no ano de 2020, quando bancos e seus clientes revisaram as taxas efetivas de juros nos contratos ativos de financiamento imobiliário e prorrogaram o vencimento de parcelas por alguns meses.
Em suma, segundo a mecânica do art. 26 da Lei 9.514/97, uma vez em atraso, o devedor fiduciante é notificado através do competente Oficial do Registro Imobiliário para purgar a mora no prazo de 15 dias. Caso não regularize o débito, o Registro Imobiliário certifica o fato e promove, após 30 dias, caso o devedor se mantenha inadimplente, a averbação na matrícula do imóvel para consolidar a propriedade em nome do fiduciário (normalmente um banco), que poderá promover o leilão extrajudicial do imóvel ou, então, adjudicá-lo em seu nome, observando requisitos formais quanto a publicação de editais e outras formalidades.
Invariavelmente, os imóveis permanecem ocupados pelo devedor fiduciante mesmo após a averbação da consolidação da propriedade em nome do fiduciário. Nestas hipóteses, a Lei 9.514/97 prevê em seu art. 37-A que o devedor pagará ao credor ou a quem vier a sucedê-lo, uma Taxa de Ocupação do Imóvel, por mês ou fração, no correspondente a 1% do valor do imóvel, computado e exigível “desde a data da consolidação da propriedade fiduciária no patrimônio do credor fiduciante”, até a data em que este, ou seus sucessores, vierem a ser imitidos na posse do imóvel. Mas nem sempre foi assim.
O art. 37-A já teve duas redações. A primeira, por inclusão da Medida Provisória nº 2.223/2001 e pela Lei 10.931/2004, previa que Taxa de Ocupação do Imóvel seria exigível desde “a data da alienação em leilão” até a data em que o fiduciário ou seus sucessores viessem a ser imitido na posse do imóvel.
Por ocasião desta primeira redação, a Terceira e a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça haviam firmado entendimento, no ano de 2012, para reconhecer que a consolidação equivalia a uma operação de transferência jurídica patrimonial, já que o credor deixava de ter a propriedade meramente resolúvel, incorporando-a em seu sentido pleno, fazendo jus, portanto, à compensação pela posse injusta exercida desde a aquisição do novo título, até a desocupação do imóvel. (REsp 1328656/GO).
Em suma, para o STJ, a Taxa de Ocupação do Imóvel poderia ser cobrada do devedor antes da realização dos leilões, pois o bem não se encontrava mais na sua posse derivada, configurando-se, assim, o esbulho, sendo injusta a permanência no imóvel a título gratuito.
Nesta ocasião, o STJ ressaltou que a Taxa de Ocupação do Imóvel tem por objetivo compensar o novo proprietário em razão do tempo em que se vê privado da posse do bem adquirido, cabendo ao antigo devedor fiduciante, sob pena de enriquecimento sem causa, desembolsar o valor correspondente ao período no qual, mesmo sem título legítimo, ainda usufrui do imóvel.
Portanto, a atual redação do art. 37-A da Lei 9.514/97, acabou por acolher a orientação jurisprudencial do STJ, agora prevendo em seu texto que o termo inicial da incidência da taxa de ocupação “é a data da consolidação da propriedade fiduciária no patrimônio do fiduciante.”
Contudo, sobreveio nova orientação da Terceira Turma, modificando o seu posicionamento anterior, para determinar que o termo inicial da exigibilidade da taxa de ocupação de imóvel alienado fiduciariamente seria a extinção da dívida, que ocorre somente após frustrada segunda tentativa de leilão.
Por ocasião do julgamento do REsp 1401233/RS, a Terceira Turma adotou o entendimento da “incidência da taxa de ocupação somente após a extinção da dívida”, pois “a taxa de ocupação é devida somente após a alienação do imóvel em leilão, haja vista que a propriedade fiduciária não se equipara à propriedade plena, estando vinculada ao propósito de garantia da dívida, nos termos do art. 1.367 do Código Civil”. O entendimento foi reiterado no julgamento do REsp 1378468/SP no ano de 2018, tendo a Terceira Turma afirmado que “havendo a extinção da dívida, o imóvel não estará mais afetado ao propósito de garantia, passando a integrar o patrimônio do credor de forma plena, passando, então, a titularizar os poderes inerentes ao domínio e, consequentemente, aos frutos decorrentes do imóvel, como a taxa de ocupação.”
Já a Quarta Turma, manteve o entendimento anterior no sentido oposto, reafirmando que o termo inicial para incidência da Taxa de Ocupação era a consolidação da propriedade fiduciária em favor do fiduciante.
Instaurada a divergência entre Terceira e Quarta Turma, e verificada a hipótese de consolidação da jurisprudência, a Terceira Turma modificou novamente seu entendimento para se alinhar à posição da Quarta Turma, consolidando o entendimento de que o termo inicial da exigibilidade da taxa de ocupação, mesmo em sua redação original, é a data da consolidação da propriedade no patrimônio do credor.