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A Lei 8.009/90, que regulamenta a impenhorabilidade do bem de família, dispõe expressamente em seu artigo 1º que “O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.”.
Da leitura da Lei, verifica-se que o valor do imóvel é irrelevante para determinar a sua impenhorabilidade, sendo que essa condição depende apenas da destinação do bem: se destinado à moradia permanente do sujeito, do casal ou do núcleo familiar, então está resguardado pela regra da impenhorabilidade (art. 5º da Lei 8.009/90).
Todavia, acórdão recente proferido pela 16ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, em votação não unânime na ocasião do julgamento de recurso de agravo de instrumento*, deferiu a penhora de bem de família com fundamento no valor do imóvel (aproximadamente R$ 24.000.000,000), destacando que se trata de “possibilidade excepcional”.
De acordo com o acórdão, o artigo 1º da Lei 8.099/90, apesar de nada ter mencionado acerca do valor do imóvel considerado bem de família, não pode ter interpretação “dissociada de seus fins sociais e das exigências do bem comum, bem como dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, proporcionalidade, razoabilidade, legalidade, publicidade e eficiência […]”. Com isso, mencionou que “nenhuma pessoa, ainda que integrante do topo da pirâmide econômica da sociedade, necessita de um imóvel nesse valor para a preservação de sua dignidade como pessoa humana.”.
A conclusão adotada pelo acórdão foi no sentido de que vedar a penhora de imóvel de valor vultoso fere os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, de modo que foi autorizada a penhora do imóvel com a reserva de 10% de seu valor (R$ 2.400.000,00) ao devedor, que permitiria, no entendimento do acórdão, “a aquisição de imóvel de razoável conforto em qualquer cidade deste País.”.
Houve declaração de divergência de um dos membros da Câmara, o qual destacou a ausência de previsão legal para que o bem de família de alto valor seja penhorado.
Por ainda não ter transitado em julgado, o acórdão está sujeito à reforma pelo Superior Tribunal de Justiça. Trata-se de decisão relevante que, se mantida, poderá fomentar uma alteração no entendimento jurisprudencial sobre a impenhorabilidade do bem de família, à luz de um novo requisito não previsto em lei: o valor do imóvel.
*Agravo de Instrumento n.º 2075933-13.2021.8.26.0000