Newsletter CKM_
Cadastre-se para receber nossas publicações por e-mail.
Acompanhe também no
Em decorrência da pandemia de COVID-19, os tribunais passaram a adotar diversas medidas sanitárias para combater o contágio no âmbito forense. Apesar de necessárias, por vezes tais medidas dificultaram ou obstaram o cumprimento dos procedimentos descritos em lei. A exemplo disso, citamos o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET), instaurado pela Lei n.º 14.010/2020, que suspendeu, por 4 meses, a execução de decisões liminares para desocupação de imóveis urbanos dados em locação (art. 9º).
Contudo, certamente um dos procedimentos mais prejudicados foi o rito de prisão civil na execução de alimentos. Durante o período de 10 de junho a 30 de outubro de 2020, a prisão civil por dívida alimentícia, em âmbito nacional, só pôde ser cumprida em modalidade domiciliar, nos termos do art. 15 da Lei n.º 14.010/2020.
Por óbvio, a prisão domiciliar não possui o mesmo condão coercitivo que a prisão em estabelecimento prisional, o que prejudicou a eficácia da medida, por ser eminentemente coercitiva.
Após 30 de outubro de 2020, a referida vedação perdeu sua eficácia, não podendo ser aplicada. Todavia, seus efeitos foram estendidos pelo entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça, impedindo a prisão civil do devedor de alimentos em regime fechado, enquanto perdurar a pandemia, com fulcro na Recomendação nº 91/21 do CNJ (HC n.º 645.640/SC, Relatora Ministra Nancy Andrighi, DJe de 26/3/2021).
Para além disso, alguns tribunais estaduais entenderam pela impossibilidade total da prisão civil por dívida alimentícia, mesmo que em regime domiciliar, a exemplo do TJDFT (HC n.º 0706777-90.2020.8.07.0000, Relator Desembargador Luis Gustavo Barbosa de Oliveira, j. em 03/04/2020).
Isso causou a total ineficácia do rito prisão nas execuções de alimentos, até então tido como rito mais efetivo para cobrança de alimentos, pois, neste procedimento, a penhora só é possível se o devedor, mesmo após a sua constrição pessoal, não pagar o débito alimentar, nos termos do art. 530 do Código de Processo Civil.
Portanto, com a impossibilidade da prisão do devedor de alimentos, muitos tribunais entenderam que não seria lícito penhorar bens do Executado, o que retirou por completo a eficácia e utilidade do rito de prisão da execução de alimentos.
É exatamente por isso que o Superior Tribunal de Justiça, no dia 28/06/2021, emitiu o Informativo de Jurisprudência n.º 702, dando destaque para o entendimento firmado nos autos REsp 1.914.052-DF, de Relatoria do Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 22/06/2021: “É possível a penhora de bens do devedor de alimentos, sem que haja a conversão do rito da prisão para o da constrição patrimonial, enquanto durar a impossibilidade da prisão civil em razão da pandemia do coronavírus”.
Dessa forma, no contexto da pandemia de COVID-19, torna-se possível realizar a penhora de bens do devedor de pensão alimentícia, sem que seja necessário converter o rito de prisão para rito penhora.
Na realidade, o entendimento recentemente prolatado pelo STJ já vinha sendo aplicado, ainda que de modo não pacífico, nos tribunais estaduais.
No âmbito de São Paulo, destacamos a decisão monocrática proferida nos autos do Agravo de Instrumento n.º 2137095-09.2021.8.26.0000, que se entendeu pelo cabimento de penhora de 30% sobre o auxílio emergencial recebido por devedor de pensão alimentícia, prescindindo da conversão do rito de prisão para constrição patrimonial.
Tais decisões representam grande avanço para efetiva tutela jurisdicional do alimentando, posto que guardam a natureza de subsistência dos alimentos, que são recursos indispensáveis e de necessidade imediata, além de, no mais das vezes, coincidirem a tutela do melhor interesse do menor e com o princípio da prioridade absoluta, aplicado no bojo do Estatuto da Criança e do Adolescente.