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O CPC de 2015, no artigo 190, expressamente prevê a figura do negócio jurídico processual, instrumento por meio do qual as partes podem livremente pactuar as regras processuais a serem aplicadas ao litígio que eventualmente venha a surgir de suas relações, adequando o procedimento processual padrão às conveniências do negócio específico e das partes.
Assim, a novidade legislativa causou uma profusão de “cláusulas processuais” que passaram a ser analisadas pelo Poder Judiciário inicialmente sob a ótica de sua validade. Ou seja, para que as regras processuais pactuadas pelas partes sejam aplicadas no processo, o Juiz deverá primeiramente validar tais convenções, para depois aplicá-las.
Uma das convenções processuais que vem sendo amplamente utilizada é aquela que autoriza a realização de arrestos e penhoras, inaudita altera pars, em processos de execução, como forma de conferir maior efetividade ao processo. Contudo, no recente julgamento do Recurso Especial n.º1.810.444 – SP, a Quarta Turma do STJ declarou que tal cláusula é anulável, porque vincularia a atuação do Magistrado à convenção das partes, retirando-lhe a liberdade para analisar o caso concreto e indeferir as medidas constritivas requeridas ab initio.
De acordo com entendimento estampado no acórdão, “As funções desempenhadas pelo juiz no processo são inerentes ao exercício da jurisdição e à garantia do devido processo legal, sendo vedado às partes sobre elas dispor”, concluindo, portanto, que somente o Magistrado, analisando o caso concreto, poderá reputar válida ou inválida a disposição que prevê o bloqueio de bens antes da realização da citação.
Em que pese o resguardo à atuação do Juiz no processo, entende-se que referida decisão influenciará diretamente na efetividade das execuções, sendo certo que muitas delas acabam frustradas em razão de manobras patrimoniais levadas a efeito pelos executados, que disporiam de menos tempo para realizá-las caso pudessem sofrer constrições antes mesmo de serem informados sobre a existência do processo de execução, pela citação.
Ainda, eventual bloqueio de ativos antes da citação não retira do Juiz a possibilidade de revisar tal ato após a citação, caso o Executado demonstre qualquer fato modificativo, extintivo ou impeditivo do direito do Exequente, sem que haja prejuízos para as partes e para a execução.
Mais curioso ainda é o acórdão admitir que as partes podem transacionar sobre a distribuição do ônus da prova, retirando do Juiz a possibilidade de distribuir o ônus da prova conforme o caso concreto (mesmo sendo o Juiz o destinatário dela), e não poder dispor sobre o momento processual dos atos de constrição patrimonial. Ainda mais se considerar que o Juiz não é destinatário dos valores ou bem previamente bloqueados, mas sim as partes, que livremente pactuaram a possibilidade de bloqueio anterior à citação.
De toda forma, o STJ entende que a previsão de bloqueio de bens antes da citação adentra a esfera de atuação do magistrado e, assim, somente poderá ser reputada válida se ele entender possível no caso concreto. Portanto, não se trata de nulidade da cláusula, mas sim de juízo prévio de sua admissibilidade no caso concreto.
Dessa maneira, para evitar a anulação da cláusula, caberá às partes e seus advogados, ao formularem o negócio jurídico processual e/ou requererem sua aplicação em Juízo, fundamentarem o pedido (por exemplo, demonstrando que a dívida em execução decorre de outras anteriormente inadimplidas, ou que o devedor sofre diversas execuções, aumentando a possibilidade daquela restar frustrada etc.), de forma a convencer o Magistrado de que a cláusula é válida e deve ser aplicada.