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O artigo 50 do Código Civil dispõe que o juiz pode desconsiderar a personalidade jurídica para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados, direta ou indiretamente, pelo abuso. Para tanto, a parte interessada ou o Ministério Público deve demonstrar o abuso da personalidade jurídica, que ocorre mediante desvio de finalidade ou confusão patrimonial.
Não só sociedades empresariais podem ser ter sua personalidade jurídica desconsiderada: o instituto se aplica às pessoas jurídicas no geral.
Recentemente, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça julgou o Recurso Especial n.º 1965982/SP e reconheceu que os fundos de investimento podem sofrer os efeitos da desconsideração da personalidade jurídica.
A Turma julgadora reconheceu que os fundos de investimentos são destituídos de personalidade jurídica, todavia, podem ser titulares de direitos e obrigações em nome próprio. O seu patrimônio pertence, em regime de condomínio, a todos os investidores (cotistas), de modo que, em princípio, todo o patrimônio não poderia responder pela dívida de um cotista, mas sim apenas a sua cota-parte. No entanto, no entendimento da Turma julgadora, essa regra deve ceder se houver comprovação inequívoca de que a constituição do fundo é fraudulenta, ou seja, foi criado para ocultar patrimônio de empresas de um mesmo grupo econômico.
Vejamos a conclusão adotada pelo Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Relator do recurso:
“[…] as cotas dos fundos de investimento podem ser objeto de penhora em processo de execução por dívidas pessoais dos próprios cotistas, mas não podem ser penhoradas por dívidas do fundo, tampouco de outros cotistas que não tenham nenhuma relação com o verdadeiro devedor. Todas essas regras, no entanto, de obrigatória observância em circunstâncias normais, devem ceder diante da comprovação inequívoca de que a própria constituição do fundo de investimento se deu de forma fraudulenta, como modo de encobrir ilegalidades e ocultar o patrimônio de empresas pertencentes a um mesmo grupo econômico, sempre se tomando a necessária cautela para não atingir as cotas titularizadas por quem não possui nenhuma relação com o executado.”
No caso, houve, portanto, demonstração de que o próprio fundo de investimento foi constituído para ocultar patrimônio de devedores dos credores, e que os próprios devedores eram titulares da integralidade das cotas do fundo, justificando a desconsideração.
Referido acórdão ainda pontuou que eventuais cotistas de fundos que não guardem qualquer relação com os atos fraudulentos e com os devedores não poderão sofrer prejuízos decorrentes da desconsideração, ou seja, não poderão ter suas cotas, ou o valor a elas relativos, direcionados para o pagamento da dívida.
A decisão é de conhecimento importante por parte daqueles que lidam com execuções, a fim de buscarem formas efetivas de recuperação de crédito, bem como por parte dos condôminos dos fundos de investimento, que devem conhecer as consequências práticas da decisão da Corte.