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Comentário: Rodrigo Lacerda O. Rodrigues Meyer da equipe de Litígios e Contratos CTA_
A decisão abaixo foi recebida com surpresa pelos operadores do direito que atuam com direitos autorais, uma vez que, na nossa opinião, amplia indevida e ilegalmente a autorização outorgada pelos titulares dos direitos autorais para exploração da obra. O caso revela que uma obra de artes plásticas cedida em comodato para venda em galeria foi reproduzida em campanha publicitária, sem que tenha sido garantido ao titular dos direitos qualquer indenização por dano material ou moral.
Primeiramente, cabe uma distinção entre quais seriam os fundamentos para indenização por cada modalidade de dano. O dano material seria devido pela simples utilização de obra protegida (quadro) em uma obra derivada (peça publicitária). Isso porque a utilização de uma obra dentro de outra presume a anuência do detentor dos direitos autorais da primeira. Nesse sentido, são expressos e inequívocos os artigos 77 e 78 da Lei 9.610/98 (Lei de Direitos Autorais), que exclui da alienação da obra artística o direito do adquirente de reproduzi-la (art.77) e torna necessária a autorização expressa e presumivelmente onerosa para reprodução da obra (art.78). E destes artigos decorre o dever de indenizar pelos danos materiais que o artista (ou seus sucessores), que teve uma obra comercialmente explorada em obra publicitária, deixaram de auferir caso exercem seu direito à cessão onerosa da utilização da obra.
Já os danos morais são caracterizados pela associação indevida da obra artística com o produto veiculado na peça publicitária. Com efeito, o autor da obra artística não necessariamente concordaria com vincular a sua obra ao produto objeto da peça publicitária. Além disso, não há notícias de que a obra no filme publicitário tenha sido creditada ao artista original, com o que este teve suprimido seu direito moral de autor à paternidade da sua obra (Art.24, II da Lei 9.610/98) e seu direito moral à integridade de sua obra (art.24, IV Lei 9610/98), já que experimentou a inserção indevida de uma obra sua dentro de outra criação intelectual (peça publicitária).
A decisão do STJ contraria frontalmente também a disposição do art.4º da Lei de Direitos Autorais, que determina a interpretação restritiva dos negócios jurídicos envolvendo direitos autorais. No caso analisado, verifica-se que o artista entregou quadro seu para que uma galeria vendesse o suporte físico da obra (a tela). No entanto, a tela foi utilizada para ser exibida dentro de uma peça publicitária, ou seja, claramente houve um desvio de finalidade da obra artística originalmente entregue à galeria para venda. Assim, conforme orientação do art. 4º, analisado em cotejo com os artigos 77 e 78 da Lei de Direitos Autorais, dever-se-ia interpretar restritivamente o negócio envolvendo a entrega da tela para venda, bem como considerar indevida a utilização dela em peça publicitária, com a consequente fixação de indenização pelos danos materiais e morais experimentados pelo autor.
E a decisão abaixo abre precedente importante, uma vez que a inclusão de obras artísticas dentro de outras obras protegidas (peças publicitárias, livros, filmes etc.) sem que seja necessária a autorização do detentor dos direitos autorais permitirá que sejam utilizadas imagens de obras consagradas (tais como imagens do Cristo Redentor, da Torre Eiffel, entre outras, sobre as quais são cobrados direitos autorais por quem as utiliza) sem sequer exigir da titular autorização para tanto.
Há, portanto, uma espécie de autorização prévia para a utilização indevida de obras protegidas dentro de outras obras, reduzindo não só o ganho monetário dos artistas, mas também impossibilitando que suas obras sejam utilizadas para finalidades com as quais os artistas não concordam, ferindo de morte seus direitos morais de autor que, por serem uma derivação de suas personalidades, encontra proteção constitucional, razão pela qual deverá ser interposto um recurso ao STF, a fim de dar a palavra final sobre o tema.
Notícia: Utilização de obra de arte em cenário de filme publicitário não gera violação de direitos autorais
A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou decisão que negou a artista plástica indenização por violação de direitos autorais. A violação teria ocorrido em virtude de exibição de uma tela de sua autoria como parte do cenário de um filme publicitário, veiculado em canais de televisão por vários meses, sem sua licença.
Segundo a artista, a obra foi entregue em consignação a empresa para exposição e venda. Três anos depois, quando a obra ainda estava na posse da empresa, ela apareceu em cenário de filme publicitário. A artista afirmou que esse uso, sem a sua autorização e sem contraprestação financeira, causou-lhe prejuízos. Assim, moveu ação de indenização contra três empresas: a contratante do filme publicitário, a empresa que produziu o filme e a empresa responsável pela exposição e venda da obra.
Objetivo principal
A sentença condenou solidariamente as três empresas ao pagamento de R$ 4 mil por danos morais. Entretanto, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) considerou que não havia o dever de indenizar, pois a obra não havia sido utilizada indevidamente.
O TJRJ fundamentou a tese nas limitações contidas no inciso VIII do artigo 46 da Lei 9.610/98, que diz que não constitui ofensa aos direitos autorais a reprodução de obra integral, desde que ela não seja o objetivo principal da obra nova e que não prejudique a exploração normal da obra reproduzida, além de não causar um prejuízo injustificado aos legítimos interesses dos autores.
Exceção à regra
No STJ, o relator do recurso, ministro Luis Felipe Salomão, explicou que a lei de direitos autorais prevê que a utilização da obra depende de prévia e expressa autorização do autor. Contudo, o direito do autor possui restrições originadas tanto na própria lei como em leis e tratados internacionais, em função do interesse público e do desenvolvimento intelectual e cultural da sociedade.
Salomão destacou que essas restrições serão a exceção à regra do exercício exclusivo e ilimitado do direito do titular. O ministro citou critérios que precisam ser satisfeitos para que não haja violação do direito autoral, como “não poder ser a obra o centro das atenções quando comparada à obra nova no bojo da qual seria posta. Sua natureza acessória deve ser evidente a ponto de não prejudicar, não desfigurar a obra nova, caso seja dela retirada”.
Nesse último ponto, o relator ressaltou que os prejuízos que a artista alegou ter sofrido, “na verdade, têm origem no descumprimento de um acordo realizado com uma das rés, a galeria de arte, e não, como quer parecer, na violação a um direito autoral seu, consistente na exposição desautorizada”.
Para Salomão, como não existem informações “detalhadas” das condições do contrato firmado entre a artista e a galeria de arte responsável pela comercialização da obra, fica “impossível a verificação se, de fato, era devida a contraprestação pela exposição da obra no filme publicitário”.
Por fim, acrescentou: “Nesse sentido, impossibilitada a verificação do prejuízo injustificado, foi preenchido mais um dos requisitos limitadores dos direitos autorais”.
REsp 1343961
(Fonte: http://goo.gl/6YqHfV)